a sensibilidade aflorada não deixa digerir nada fora do simples. qualquer conflito vira um inferno... qualquer sensação de que um deslize foi cometido é motivo de quase pânico. perde-se a fome. existe a vergonha, a vontade de sumir. solidão.
dentro desse mundo repleto de barbárie, há de se começar por algum lugar e, como trabalho em escolas, achei que poderia compartilhar o que pretendo fazer ano que vem com meus estudantes, todos do ensino médio. de repente ajuda, no mínimo, a combater essa enxurrada de violência, ódio e racismo. quiçá, mudar o mundo pra melhor, de uma vez.
1. "a vida não é útil" (krenak)
sugestão: 9o (fund2) e ensino médio
-- cuidar do planeta
-- relação do humano com a tecnologia
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2. "olhos d'água" (conceição evaristo)
sugestão: ensino médio
- - pelo menos dois contos: o primeiro e mais um
-- debate sobre racismo estrutural; amor; passado da negritude
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3. "pequeno manual antirracista" (djamila)
-- racismo institucional e estrutural
sugestão: ensino médio, 8o. e 9o. anos
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4. "campo geral" (g rosa)
sugestão: ensino médio
-- família o que é; infância; ética; busca de felicidade
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5. "o conto da ilha desconhecida" (saramago)
sugestão: ensino médio
-- busca de felicidade; rei versus povo; sonhar; coletividade; viajar
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6. "ideias para adiar o fim do mundo", krenak
sugestão: 9o. ano e ensino médio
-- ambiente; futuro; comunidades indígenas; tecnologia
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7. "o visconde partido ao meio" (calvino)
sugestão: 9o ano e 1a. série ensino médio
-- maniqueísmo; bem e mal; preconceito; democracia
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8. "cartola - dez sambas" (agenor de oliveira / música)
-- lirismo na literatura, desde idade média; questão social; identidade
sugestão: 8o. e 9o. anos; ensino médio
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9. "o meu amigo pintor" (lygia bojunga)
- - prosa cuja história se passa durante a ditadura militar: relação entre um garoto e um artista
- - amizade; política; arte plástica
sugestão : 9o ano a 2a série ens médio
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as leituras precisam ser compartilhadas com pelo menos mais um educador, educadora... ideal era que toda classe docente, em algum momento do ano, tratasse de um tema -- pelo menos -- dentro da leitura escolhida; mesmo no caso das chamadas "exatas" é possível ter um instante pra discutir, por exemplo, como a ciência, pode colaborar para acabar com racismo, preservar mais a natureza etc. olhem, em "conto da ilha..." o tema é a busca de um lugar novo que muito bem pode estar dentro de cada um... navegar é preciso, diz um ditado luso... por isso, unir música, história e física pode tornar a leitura de saramago (item 5) algo surpreendente. é possível sim, juntar as áreas de matemática, arte e língua portuguesa para discutir economia, poluição, mundo digital, espírito colaborativo, reciclagem... ideia não falta.
olhe, se você acha que não dá pra salvar o mundo todo agora, a gente pode tentar salvar uma pessoa de cada vez, mês a mês, ano a ano.
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ATENÇÃO - -
o viscone partido ao meio - calvino - compre aqui
ailton krenak - a vida não é útil - compre
olhos d'água - evaristo - compre
o meu amigo pintor - lygia - compre
pequeno manual antirracista - compre
o conto da ilha desconhecida - saramago - compre
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fernanda magnota deu a letra e publicou texto de respeito: por um brasil que não trate política como entretenimento.
[ jade picon e a sandália com temática afro ]
coloquei, aqui, dois textos como uma coletânea para você, estudante, se basear e desenvolver uma redação argumentativa: pode ser artigo de opinião, crônica argumentativa ou a clássica redação modo-enem, modo-fuvest etc.
os textos são estes abaixo, basta clicar, ler e voltar aqui
jade e acm neto - privilégios da branquitude
comunidade preta reage a jade picon
o que é importante desenvolver se encontrar proposta que exiga uma argumentação e ainda peça soluções para questão do racismo.
primeiro: diferença entre racismo estrutural e institucional.
- racismo estrutural: sociedade cresceu baseada na ideia de que o negro é inferior ao branco (também vale para comunidades indígenas)
- racismo institucional: prática de segregação feita por instituições que se sustentaram no racismo estrutural; por exemplo: empresas que simplesmente não contratam negros; publicidade de produtos apenas com modelos brancos etc
vamos à redação argumentativa
1. crie uma tese, sua, a respeito; por exemplo:
- racismo institucional se combate na escola e na infância -
2. argumentos que defendam a tese
(usei tópicos pra ficar objetivo / desenvolva parágrafo para cada item)
- com estudantes, promover podcast sobre o tema; mostra cultural contendo o assunto "negritude" e "raízes" da identidade brasileira
- documentário "amarelo", de emicida (toda escola)
- manual antirracista de djamila (qualquer idade) - livro
- niketche, paulina (ensino médio) - livro
- black power de akin, kiusam (fundamental 2) - livro
estes itens acima, quando desenvolver seu texto, devem reforçar a ideia de que através do debate, na escola, aumenta-se a chance do indívíduo crescer com clareza a respeito das diferenças sociais, étnicas, no país.
lembrar que no modo enem, antes da conclusão é preciso apresentar proposta de solução para o que foi dado no tema.
sendo assim, reforce a necessidade de um chamamento de toda a comunidade (família, vizinhança etc) para dentro da escola, durante atividades a respeito do racismo.
3. conclusão: reforço da tese, ou seja, através da educação e a vivência de toda a comunidade junto à escola, será possível minimizar e acabar com racismo estrutural e, consequentemente, o institucional
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[ Vaga Música, 1942 ]
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milly lacombe, mais uma vez, deixando claro o mundo atual:
"Vera Magalhães virou alvo da violência Bolsonarista. Não são lobos solitários que investem contra o corpo e a dignidade da jornalista. São agentes bem orientados por um tipo de lógica de morte que há mais de quatro anos controla esse país em todos os níveis. O Bolsonarismo precisa da violência de gênero como um vampiro precisa de sangue. Esse é um dos pilares que estruturam a sociedade que bolsonaristas querem erguer (...) Nesse projeto de sociedade, florestas viram pó, corrupção está liberada (chamam rachadinha que é para não assustar), pessoas negras não apitam muito, LGBTQs podem morrer porque não fazem falta. Nessa sociedade, a lógica é miliciana do começo ao fim. Vera Magalhães foi escolhida por essa turma covarde para virar, literal e simbolicamente, o rosto do inimigo (...)" [ portal UOL ]
clique para ler o texto todo de milly

[ legião urbana, brasília, década 1980 ]
MAIS UMA VEZ
[ Renato Russo ]
carlos henrique carneiro, natural ribeirão preto, sp
- nasce no hospital são francisco, dezembro de 1964
1966: ano internacional do arroz - com quase dois anos, já come
1967: morre guimarães rosa -- não fica sabendo
1972: entra na primeira série, ensino fundamental -- chamado de "grupo escolar". escola "guimarães júnior". professora: noêmia
1982: escreve crônicas e poemas enquanto estudante de ensino médio. chega a publicar poesias, "poeta em construção", edição do autor, como se vê na foto.
- formação: letras, unicamp, 1984 a 88

[ aos 17 anos, personagem de "deus me livre", luiz puntel, ed ática ]
inciou profissionalmente no colégio graphos, 1986, nas cidades de são josé do rio pardo, em mococa, itapira e esp. s. pinhal, todas no estado de são paulo. professor de literatura e redação. trabalhou na rede objetivo, em campinas, mogi-mirim, mogi-gauçu e bragança paulista, tudo isso entre 1986 e 95.
por quase vinte anos, trabalhou no colégio visconde de porto seguro -- 1992 a 2010 (coordenador e professor), em valinhos.
desde 2020, é professor de literatura e história da arte, no curso alethus, rede poliedro, valinhos. mora em campinas.
escritor: "poeta em construção", 1982; "raposa", 2004; "camões em perigo", 2015; "determinada mandioca", 2013; "literatura não autorizada", 2014; "abolição via vargas", 2021 ; "atlântida" (monólogo - não publicado), 1998; "letra líquaida", 2024 além de artigos sobre literatura no ensino médio, resenhas de obras literárias e afins, nesses últimos trinta anos.
1986/87: passa a morar com zuleika minussi, em campinas, rua antonio cezarino. casamento duraria 15 anos
1989: publica artigos aos sábados no jornal "diário do povo", campinas.
1998: junho, dia 21 -- com manuela soares --, monólogo "atlântida", escreveu e dirigiu. campinas, sp. apoio editora costa-flosi. assessoria de marcelo campos.
Chora, disfarça e chora
Aproveita a voz do lamento
Que já vem a aurora
A pessoa que tanto querias
Antes mesmo de raiar o dia
Deixou o ensaio por outra
Ó triste senhora
Disfarça e chora
Todo o pranto tem hora
E eu vejo seu pranto cair
No momento mais certo
Olhar, gostar só de longe
Não faz ninguém chegar perto
E o seu pranto, ó triste senhora
Vai molhar o deserto
Chora, disfarça e chora
. . . . . . . . . . . . . . .
samba critica com algum escárnio o amor platônico de uma senhora por alguém. este objeto do desejo acaba indo para outra pessoa. "deixar o ensaio" pode significar metaforicamente, ensaio de escola de samba, ou seja, o sambista mudou de escola antes do carnaval; ou então: seu amor se foi antes da realização amorosa desejada... o que gerou choro. repare a figura de linguagem hipérbole: lágrimas vão molhar o deserto. é demais.
a letra dá uma lição à senhora triste: "gostar de longe" não resolve.
cartola foi um dos fundadores da escola de samba estação primeira de mangueira. o apelido "cartola", veio dos tempos em que trabalhou como pedreiro e, para proteger-se, usava chapéu.
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saiba mais:
drummond tem um poema despretensioso, desses que só funcionam quando a gente lê os outros do mesmo livro. enfm, chama-se "papai noel às avessas". nele, o leitor acompanha a entrada de um papai noel numa casa humilde e ele sai de lá carregando os brinquedos das crianças.
o texto saiu no jornal, pela primeira vez em 1927. di cavalcanti gostou e fez desenho. pouco tempo depois, em 1930, o poema seria publicado em "alguma poesia".
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leia o poema todo:
Papai Noel entrou pela porta dos fundos
(no Brasil as chaminés não são praticáveis),
entrou cauteloso que nem marido depois da farra.
Tateando na escuridão torceu o comutador
e a eletricidade bateu nas coisas resignadas,
coisas que continuavam coisas no mistério do Natal.
Papai Noel explorou a cozinha com olhos espertos,
achou um queijo e comeu.
Depois tirou do bolso um cigarro que não quis acender.
Teve medo talvez de pegar fogo nas barbas postiças
(no Brasil os Papai-Noéis são todos de cara raspada)
e avançou pelo corredor branco de luar.
Aquele quarto é o das crianças
Papai entrou compenetrado.
Os meninos dormiam sonhando outros natais muito mais lindos
mas os sapatos deles estavam cheinhos de brinquedos
soldados mulheres elefantes navios
e um presidente de república de celulóide.
Papai Noel agachou-se e recolheu aquilo tudo
no interminável lenço vermelho de alcobaça.
Fez a trouxa e deu o nó, mas apertou tanto
que lá dentro mulheres elefantes soldados presidente brigavam
[ por causa do aperto.
Os pequenos continuavam dormindo.
Longe um galo comunicou o nascimento de Cristo.
Papai Noel voltou de manso para a cozinha,
apagou a luz, saiu pela porta dos fundos.
Na horta, o luar de Natal abençoava os legumes.
C D Andrade - Alguma Poesia
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saiba mais:
ADEUS, MEUS SONHOS _ Álvares de Azevedo (1831-52) Adeus, meus sonhos, eu pranteio e morro! Não levo...