o conjunto de mármore e bronze "êxtase de santa tereza" (bernini, séc 17), dá conta de
um estado marcante de contraste, no estilo barroco. um jovem risonho como um escobar machadiano, segura uma seta fálica bem acima da figura feminina,
envolta em panos teocêntricos. ela parece mesmo em êxtase. está na igreja santa maria da vitória, roma.
"estou-me a vir", como dizem as portuguesas, seria bom nome para essa obra escandalosa aos valores do século 17.
o jovem, apesar das asas cristãs, bem lembra cupido, filho de vênus, figura tão cara aos amantes universais. e pagãos!
tereza é dita "santa". viveu no século 16 e registrou em texto seus encontros intensos e divinos com jesus -- ou similar. encontros físicos! está no "libro de la vida". pesquisa e crê.
fernanda magnota deu a letra e publicou texto de respeito: por um brasil que não trate política como entretenimento.
coloco aqui um trecho :
"Chegamos às vésperas da eleição presidencial no Brasil, todos de ressaca, exaustos pela exposição à tanta baixaria. (...) A culpa disso é de todos aqueles que estimulam os próprios líderes a se comportarem como apresentadores de programa de auditório. Presidente não é feito para 'mitar', é feito para conceber, negociar e implementar políticas públicas que beneficiem o interesse coletivo.(...)" F. Magnotta, setembro 2022
olhem, brasileiro, em geral, encara política com negligência, com descaso. um tanto da culpa é a postura de muitos políticos que, quando candidatos, se mostram midiáticos, palhaços, verborrágicos. não dá. mas o brasieiro já votou na xuxa (sem que fosse candidata), já votou no cacareco (rinoceronte), no tiririca, bolsonaro, pastores em geral e uma infinidade de outras figuras desprezíveis, que mereciam distância do poder público. muitos eleitores fazem isso por pura farra ou falta de estudo mesmo; e são incentivados por parcela da política que procura capturar justamente esses eleitores iletrados. escolas brasileiras perdem excelente oportunidade de começar a resolver o problema quando fingem que nada acontece para além dos muros da sala de aula. uma pena. as públicas levam ligeira vantagem sobre as privadas, via de regra, porque podem trabalhar sobre projetos, já as privadas estão assentadas em conteúdos teóricos. em geral, estudantes saem das escolas sabendo o que é barroco, as leis de newton, a fotossíntese e a economia na roma antiga... mas depois, elegem políticos anti-povo; elegem políticos que desmatam amazônia, que se vangloriam da corrupção. é quase um meme. é o caos. simular eleição, explicar como funciona o congresso, mostrar do que o país necessita e qual seu papel na onu, por exemplo, são ações tão básicas quanto existência de bebedouro no corredor ou banheiro no fim dele. tratar de temas da política local, do bairro onde a escola se insere também deveriam nortear os princípios da boa educação.
passou da hora das escolas tratarem de questões substantivas assim como tratam da vida no egito antigo ou como se forma a palavra sambódromo.
DESCREVE A ILHA DE ITAPARICA COM SUA APRAZÍVEL
FERTILIDADE, LOUVA DE CAMINHO O CAPITÃO LUÍS CARNEIRO,HOMEM HONRADO E LIBERAL, EM CUJA CASA SE HOSPEDOU
Ilha de Itaparica, alvas areias,
Alegres praias, frescas, deleitosas,
Ricos polvos, lagostas deliciosas,
Farta de Putas, rica de baleias.
As Putas, tais ou quais, não são más preias,
Pícaras, ledas, brandas, carinhosas,
Para o jantar as carnes saborosas,
O pescado excelente para as ceias.
O melão de ouro, a fresca melancia,
Que vem no tempo, em que aos mortais abrasa
O sol inquisidor de tanto oiteiro.
A costa, que o imita na ardentia,
E sobretudo a rica e nobre casa
Do nosso Capitão Luís Carneiro.
Gregório de Matos - séc 17 - Poemas escolhidos, Cultrix
poeta lista as características aprazíveis da praia de itaparica e, nela estão elementos de culinária, assim como pessoas.
tratamento dado às mulheres é o pior possível.
no século 17 era aceitável. na descrição dos prazeres, o termo "carnes",
na segunda estrofe, ganha conotação dúbia: pode ser o pescado, pode
ser gente. nessa linha, "melão" e "melancia" tornam-se metáforas de
de partes do corpo das mulhres.
tudo isso torna a úlitma estrofe bem sarcástica, uma vez que o dono
dessa farra toda é o "nobre" e "nosso" capitão luís.
Ofendi-vos , meu Deus, é bem verdade, Verdade é, meu Senhor, que hei delinquido, delinquido vos tenho, e ofendido, ofendido vos tem minha maldade. Maldade, que encaminha a vaidade, Vaidade, que todo me há vencido, Vencido quero ver-me e arrependido, Arrependido a tanta enormidade. Arrependido estou de coração, De coração vos busco, dai-me abraços, Abraços, que me rendem vossa luz. Luz, que claro me mostra a salvação, A salvação pretendo em tais braços, Misericórdia, amor, Jesus, Jesus!
GREGÓRIO DE MATOS E GUERRA - séc 17
poeta assume pecados perante cristo e busca salvação pelo arrependimento. ele -- o eu lírico -- deseja ser acolhido e trata a divindade como uma figura próxima, daí o que se costuma ler dos críticos é que o estilo barroco costuma ser uma espécie de mistura de antropocentrismo e teocentrismo. trata-se de um soneto: 14 versos e com métrica (dez sílabas poéticas por verso) ao inciar verso com o final do anterior, temos a figura de linguagem conhecida como anadiplose.
o título pergunta o que seria maior: o bem vivido e perdido ou aquilo que se perde sem ter havido a chance de alcançar. pois lá mesmo, o poeta defende que o problema maior é perder o que se viveu. na primeira estrofe, enfatiza o poeta que não pode haver tormento parecido com uma perda dessas.
soneto que tematiza a perda de um bem, possivelmente um amor. o eu lírico reforça ideia de que quem o perde não consegue reavê-lo
a memória diminuiria o problema, uma vez que resgataria o bem, via pensamento
Mancebo sem dinheiro, bom barrete, Medíocre o vestido, bom sapato, Meias velhas, calção de esfola-gato, Cabelo penteado, bom topete.
Presumir de dançar, cantar falsete, Jogo de fidalguia, bom barato, Tirar falsídia ao Moço do seu trato, Furtar a carne à ama, que promete.
A putinha aldeã achada em feira, Eterno murmurar de alheias famas, Soneto infame, sátira elegante.
Cartinhas de trocado para a Freira, Comer boi, ser Quixote com as Damas, Pouco estudo, isto é ser estudante.
[Gregório de Matos - Poemas escolhidos, ed Cultrix]
* esfola-gato - provavelmente brincadeira entre jovens, região do minho, portugal * falsídia - mentira
soneto do século 17: barroco.
satiriza e desmerece a vida do estudante, uma vez que não havia universidade, no brasil. pode ser uma referência ao jovem da afamada escola de jesuítas (1553-1759), em salvador, por onde passou gregório.
o estudante, no soneto, é desprezível, porque faz graça com freira, se envolve com moças tidas como vulgares e estuda pouco. um dado triste: o grau de vulgaridade de um jovem é dado pelo tipo de mulher com quem ele se envolve: aquela que vende seu corpo por pouco preço -- daí, o diminutivo "putinha", provavelmente -- , e também com freiras que recebem assédio de gente como este estudante vulgar. muita masculinidade tóxica. infelizmente, cultura que ainda perdura.
lembra, neste caso, parte do caráter de raposão, personagem de "a relíquia", eça de queiroz, século 19.
Infeste
toda a terra, invada os mares, Seja
um Chegay,
ou um Gaspar Soares, E
por si terá toda a Relação.
Sobejar-lhe-á
na mesa vinho, e pão, E
siga, os que lhe
dou, por exemplares, Que
a vida passará sem ter pesares, Assim
como os não tem Pedro de Unhão
Quem
cá se quer meter a ser sisudo Um
Gil nunca lhe falta que o persiga, E
é mais aperreado que um cornudo.
Coma,
beba, e mais furte e tenha amiga, Porque
o nome d'EI-Rei
dá para tudo A
todos, que El-Rei
trazem na barriga
. . . . . . . . . . . . . .
pedro de unhão
salvador,
1690, residia o desembargador pedro de unhão castelo branco; hoje abriga o museu de arte moderna, bahia
gil
provável referência a gil vicente, dramaturgo satírico português - séc 16
chegay
e gaspar
provavelmente, figuras com poder político, em salvador
. . . . . . . . . . . . . . . . .
soneto do século 17 faz delação dos vícios da vida política de salvador: aqueles que possuem poder terão conforto, podendo até roubar
por isso, aos que são imorais, nunca faltará um gil que o persiga, ou seja, sempre haverá um escritor satírico a denunciar crimes
gregório é o primeiro escritor que faz denúncia social, na literatura brasileira
soneto típico do estilo "boca-do-inferno" de gregório eu lírico se incomoda com as críticas e perseguições e, então, diminui a classe e a intelectualidade daqueles que o criticam, tratando-os por invejosos e néscios
falei com meus alunos, esta semana, sobre o conto "o espelho" -- veja vídeo, ao final do texto, aqui -- de machado de assis. a história é simples. jacobina, aos vinte e poucos anos de idade, rio de janeiro, século 19, é alçado ao cargo de alferes o que causa júbilo na família e certa inveja em alguns amigos. a tia marcolina lhe dá de presente um espelho, lá dos tempos de joão sexto. num determinado momento da narrativa, jacobina se vê sozinho, no sítio da tia -- que se ausentou por uns dias -- e treme de medo. passa dias nervoso, tenso. os escravos tinham fugido. para piorar, olhava no espelho grande que ganhara e não via sua imagem. as leis da física só voltaram ao normal depois que ele vestiu sua farda de alferes. é um conto sobre a vaidade. no texto, usam-se expressões como "alma exterior", "alma interior". padre vieira e muitos sacerdotes cristãos também condenavam a vaidade. até hoje, dar destaque a si mesmo, tatuagens, apliques no cabelo, lentes de contato coloridas, pulseiras, anéis, piercings pelo corpo, tudo ainda causa alguma repulsa em muita gente. apesar de haver quem se diga distante da cristandade -- nascedouro das condenações à liberdade humana -- muita gente se pega julgando e mostrando repulsa ao que pode tornar alguém um destaque. é pena.
babel – bíblico: torre inacabada por
castigo divino, daí seus idiomas se confundiram; caos
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
"labirinto confuso", no título, indica um pleonasmo e intensifica o estado conflituoso do eu lírico
- tema do texto pode muito bem combinar com estado de luís da silva, em angústia ou mesmo rubião, lá do quincas borba - estilo barroco se revela nas ocorrências de contradições ao longo do texto